Corrupção reduz apoio à democracia
Análise

Corrupção reduz apoio à democracia

Na América Latina, só 54% defendem o sistema democrático, enquanto percepção da corrupção aumenta em todos os países – exceto Paraguai

em 06/12/2016 • 09h05
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Má gestão, desvio de dinheiro público, concorrência desleal e aumento do desemprego não são os únicos efeitos negativos da corrupção. Outra consequência grave dessa prática tão comum na América Latina é a redução na crença do sistema democrático. Levantamento anual feito pelo Latinobarómetro mostra que apenas 54% dos latino-americanos defendem o regime democrático – no ano passado o apoio à democracia era de 56%.

“As razões para a queda no apoio à democracia podem variar de país para país, mas, aparentemente, o padrão comum que pode explicar o suporte menor à democracia é a corrupção. Nos países onde há escândalos de corrupção recentes, podemos observar uma queda no apoio à democracia”, analisa chileno Pablo Valenzuela, pesquisador do Latinobarómetro.

O levantamento feito pela instituição revela também que aumentou a indiferença dos latinos para com o regime político vigente. Se em 2015 20% eram indiferentes, neste ano são 23%.

Quando as pessoas percebem que a democracia não resolve os seus problemas, elas tendem a mover-se para a indiferença ou para o autoritarismo, sem pensar no longo prazo ou nas consequências, continua Valenzuela.

E não é mera coincidência que a percepção da corrupção, medida pela ONG Transparência Internacional, aumentou em todos os países da América Latina, exceto no Paraguai, que teve melhora e subiu três posições no ranking (quanto mais alto no ranking, menor a percepção da corrupção).

“A percepção é baseada principalmente em realidades. Ou seja, ela não é uma imagem ruim que emerge de rumores. De fato, a corrupção tem acompanhado os nossos países historicamente. É importante compreender que esta não é uma questão genética, os latino-americanos não são por nascimento mais ou menos corruptos do que os noruegueses ou coreanos. É uma questão de fraqueza institucional em nossos países, de educação e comportamento cívico e de valores”, analisa o mexicano Alejandro Salas, diretor regional para as Américas da Transparência Internacional.

O ranking da corrupção tem 168 países analisados. Na liderança latino-americana, como países mais transparentes e menos corruptos, estão Uruguai (21º), Chile (23º) e Costa Rica (40º) enquanto Haiti e Venezuela são considerados os mais corruptos (ambos na 158ª posição).

Pioras

As maiores quedas no ranking da corrupção na América Latina – ou seja, países em que a percepção da corrupção aumentou – aconteceram na Guatemala (caiu quatro posições em 2015 e foi para 123º) e no Brasil (caiu sete posições e foi para 76º).

Salas justifica isso devido aos grandes escândalos de corrupção recentes no Brasil (Petrolão) e na Guatemala – o presidente Otto Pérez Molina renunciou em 2015 ao ser acusado de dirigir uma rede clandestina dentro da Superintendência de Administração Tributária para desvio de verbas. Foram denunciados 45 funcionários.

Ele também lamentou a posição de países como México, Colômbia, Peru e República Dominicana, que ainda continuam na parte inferior do ranking. Para o pesquisador, essas nações só vão melhorar quando criarem medidas preventivas. “Para que serve punir um funcionário público ou político e colocá-lo na cadeia se em alguns meses vem outro e faz o mesmo ou pior?”, questiona.

Avanços

A respeito da melhora do Paraguai (alcançou a posição 130º ao subir três posições), o pesquisador da Transparência Internacional lembra que há três anos o país era o último da América Latina e que agora começou a modernizar suas instituições.

“O Paraguai ainda tem instituições democráticas fracas, no entanto, nos últimos anos tem avançado leis sobre acesso à informação, e-governo e outras medidas que são muito orientadas para a modernização do Estado”, elogia.

Outro caso interessante é Honduras, que recentemente aceitou uma comissão independente internacional, semelhante à CICIG (Comisión Internacional contra la Impunidad en Guatemala) na Guatemala, para ajudá-los a lutar contra a impunidade e a corrupção.

Sobre o escândalo da Petrobras no Brasil, que envolve centenas de políticos, funcionários públicos e empreiteiras, ele lembra que já há indícios de contaminação até em outros países, como o Peru, Equador, El Salvador e Panamá, que teriam reproduzido ou auxiliado nos esquemas de lavagem de dinheiro, financiamento ilegal de campanhas eleitorais e fraudes em licitações públicas. “Eu acho que se tornou algo tão grande porque é um abuso generalizado dos cargos públicos para enriquecimento pessoal que já dura várias décadas”, lamenta.

FOTO:  Filippo Minelli

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