Teori e outras 3 mortes suspeitas que impactaram a AL
Análise

Teori e 3 mortes suspeitas que impactaram a AL

Acidentes aéreos e assassinatos sem explicações envolvendo políticos e membros da Justiça latino-americanos geram dúvidas até hoje

em 03/02/2017 • 11h30
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Duas quedas de avião com presidentes a bordo e um procurador de Justiça morto a tiros na Argentina – ainda não se sabe se por homicídio ou suicídio. Assim como a morte de Teori Zavascki, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e então relator da Operação Lava-Jato, que morreu há 15 dias numa queda de um avião, pelo menos outras três mortes de autoridades latino-americanas desde a década de 1980 permanecem sem explicação.

Confira:

2015 – Alberto Nisman, procurador da Justiça argentina

O procurador Alberto Nisman foi encontrado na cozinha do apartamento com um tiro na cabeça em janeiro de 2015, cinco dias depois de denunciar a então presidente Cristina Kirchner, seu chanceler e três deputados por terem trabalhado para retirar os alertas vermelhos da Interpol (polícia internacional) de acusados iranianos de organizar um ataque terrorista em Buenos Aires, em 1994. Nesta ocasião, a explosão de um carro-bomba matou 85 pessoas e deixou outras 300 feridas.

Segundo o procurador, o governo argentino havia firmado um acordo com o Irã no ápice da crise econômica, em 2013, oferecendo grãos argentinos em troca de petróleo. Um dos pactos ‘secretos’ do tratado, para Nisman, era que a Argentina se “esquecesse” do atentado. Para isso, precisava retirar os alertas vermelhos aos acusados na Interpol.

A morte de Nisman gerou uma crise institucional grave, a ponto de a própria Cristina Kirchner precisar vir a público dizer que não o havia matado. Protestos contra o governo tomaram a capital.

Dois anos depois da morte do procurador, a Justiça argentina trabalha com duas hipóteses: homicídio ou suicídio. Conforme as informações surgiam, novas interpretações de sua morte vinham à tona, como a que mostrou que o tiro tinha sido disparado a centímetros de sua cabeça, aumentando a tese de suicídio, e a que a arma usada para matá-lo estava registrada em nome de um técnico que trabalhava na promotoria, amigo pessoal de Nisman.

Ele estava recebendo ameaças de morte por cartas e e-mails. Oficialmente, o Estado trata do caso como “morte duvidosa”.

1981 – Jaime Roldós, presidente do Equador

Jaime Roldós foi eleito em 1979, no Equador, no primeiro pleito presidencial sete anos depois do golpe militar. Candidato da esquerda, Roldós começou seu mandato reduzindo a jornada de trabalho para 40 horas semanais e dobrando o salário mínimo. No início dos anos 1980, bateu de frente com os EUA, governado por Ronald Reagan, ao promover medidas econômicas para fortalecer o mercado regional e denunciar atentados aos direitos humanos nos países vizinhos.

No livro Confessions of an Economic Hit Man (Confissões de um homem econômico, Cultrix, 2005), o jornalista estadunidense John Perkins defende que a principal ação de Roldós contra os interesses dos EUA foi a reorganização do setor de hidrocarbonetos, um dos principais produtos de exportação do Equador.

Em maio de 1981, Roldós discursou para milhares de pessoas no estádio Atahualpa, em Quito, dizendo que “ganhar a estabilidade democrática” era um “processo diário”. Em seguida, entrou num jato da Força Aérea rumo a Macará, na fronteira com o Peru, onde participaria de uma cerimônia. Voltaria a Quito naquele mesmo dia, mas o avião sequer completou o primeiro trecho da viagem: segundo a versão oficial aceita pelo Estado, o piloto mudou sua rota em pleno ar, passando por uma zona turbulenta que derrubou a aeronave.

Desde então, as dúvidas sobre o acidente não foram esclarecidas: Perkins, ex-consultor de agências econômicas dos Estados Unidos, diz que a morte foi planejada pelo governo do seu país, insatisfeito com a política à esquerda estabelecida no período da Operação Condor.

O jornalista equatoriano Jaime Galarza afirma que o avião foi derrubado por tiros disparados por outro avião da Força Aérea Equatoriana. Uma perícia suíça contratada por familiares e correligionários de Roldós divulgou um relatório dizendo que os motores do avião estavam desligados no momento da queda.

Em 2013, dois cineastas do país – Lisandra Rivera e Manolo Sarmiento – lançaram o documentário La muerte de Jaime Roldós, que repercutiu no continente por tentar reunir todas as inconsistências das versões oficiais e as teorias sobre um suposto ordenamento para matar o presidente, seja dos Estados Unidos ou dos militares do Equador.

1981 – Omar Torrijos, comandante em chefe do Panamá

Entre as mortes suspeitas de autoridades latino-americanas, a do comandante em chefe do Panamá, Omar Torrijos, é a mais estranha. Em julho de 1981, ele embarcou em Rio Hato, onde ficava sua casa de repouso, em um avião da Força Aérea Panamenha rumo a Coclesito para visitar um projeto agropecuário. A aeronave pousou na metade do caminho para reabastecer e, às 11h44, decolou para o destino final.

Faltando 15 minutos para a chegada, em meio a uma chuva repentina, o jato caiu no Cerro Martha, na cordilheira central panamenha, matando todos os passageiros. Segundo um camponês que testemunhou o acidente, o avião explodiu duas vezes e ficou alguns instantes em chamas no ar antes de bater no solo. Relatos de barulhos de explosões naquela manhã foram registrados entre os habitantes da cidade.

Apenas dois dias depois da desaparição da aeronave, o Panamá confirmou a morte do comandante, pouco mais de dois meses depois da de Jaime Roldós.

Líder da chamada Revolução Panamenha, em 1968, Torrijos chegou ao poder após organizar a derrubada do presidente Arnulfo Madrid, eleito naquele mesmo ano por meio de um golpe de Estado. Em março de 1969, após um período de crise, assumiu a liderança do exército nacional e se proclamou general do país, dissolvendo os partidos políticos.

Torrijos, porém, ficou conhecido internacionalmente quando, em 1973, entrou em uma campanha contra os Estados Unidos pela soberania total do Canal do Panamá, construído no início do século XX e que servia como base militar e financeira da potência norte-americana na parte latina do continente.

Quatro anos depois, ele conseguiria assinar um tratado com o presidente estadunidense Jimmy Carter que determinava o ano de 1999 como a data para a devolução do canal ao governo panamenho. Após o acordo, ele passou a negociar a construção de outro canal com empresários japoneses.

Versões não faltam para a morte de Omar Torrijos: em 1986, seu irmão e jurista Hugo Torrijos declarou ao parlamento que tinha provas que a CIA havia colocado uma caixa de Coca-Cola com explosivos dentro do avião.

Em 2004, John Perkins – o mesmo que denunciou os EUA pela morte de Roldós – disse em seu livro Confissões de um homem econômico que o governo do seu país assassinou o comandante panamenho por causa das negociações entre o Panamá e os investidores do Japão. A versão oficial, dada pelas fabricantes do avião é a de que o mal tempo foi responsável pelo acidente.

Em 1989, quando os Estados Unidos invadiram o Panamá sob a denúncia de envolvimento do general Manuel Noriega com o tráfico de drogas, todos os documentos sobre a morte de Torrijos desapareceram.

FOTO: VELÓRIO DE TEORI ZAVASCKI

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