Donald Trump é um pesadelo para a América Latina?
Análise

O que Donald Trump representa para a América Latina?

Promessa de que terminará de construir o muro na fronteira com o México e discurso de “América primeiro” confirmam a visão isolacionista do candidato estadunidense

em 27/07/2016 • 01h30
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O magnata republicano Donald Trump, recentemente confirmado como o candidato à presidência dos Estados Unidos pelo Partido Republicano, personifica o pior dos pesadelos para a América Latina. Tanto que, entre suas propostas de campanha na corrida à Casa Branca, está a construção de uma muralha separando os Estados Unidos da fronteira sul com o México. Tudo para evitar que latinos em busca do chamado “american dream” consigam entrar no território norte-americano.

Para o brasilianista e historiador britânico Kenneth Maxwell, ex-professor da Universidade de Harvard, a campanha de Trump explora “o medo e o delírio” e tem como alvos os imigrantes mexicanos, os quais ele considera “estupradores”. “A América Latina pode, de forma inadvertida, receber mais atenção”, admite ele. Mesmo que o foco seja negativo.

Maxwell lembra que Trump inflexivelmente se opôs a acordos de livre comércio, além de atacar os muçulmanos, que classifica de “terroristas em potencial”, e defende que sejam impedidos de visitar os EUA. “Esses ataques têm grande ressonância, especialmente no chamado ‘cinturão da ferrugem’, no meio-oeste do país, onde a desindustrialização devastou famílias de classes trabalhadoras”, comenta.

O especialista adverte que a retórica de “a América em primeiro lugar” − filosofia adotada por Trump − remonta às raízes profundas do populismo norte-americano e do isolacionismo, sentimento muito forte no passado.

'A América Latina não é tema central para Trump, mas os latino-americanos funcionam como ótimos bodes expiatórios durante a campanha', admite o britânico.

Se a América Latina parece estar em segundo plano, a situação não é diferente com o Brasil. Maxwell acredita que Trump não dará mais atenção ao país, a não ser uma fonte de investimentos de seus resorts e hotéis. “Mas não creio que Barack Obama tenha dado uma atenção muito séria ao Brasil, também. E o Brasil não se importou tanto com isso, sob os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff, ao se focar mais em iniciativas independentes, como o Mercosul e o Brics”, observa. “O futuro papel do Brasil é menos incerto do que o dos Estados Unidos, caso Trump se torne presidente.”

Na hipótese de se tornar o líder mais poderoso do planeta, sucedendo Obama, Maxwell alerta que Trump não poderá deixar de cumprir com suas polêmicas promessas, partes centrais de sua campanha presidencial.

'Os mexicanos já deixaram clara sua reação às ameaças de Trump. Uma coisa é certa: será um tempo muito duro para os latinos, dentro e fora dos Estados Unidos, sob um eventual governo Trump. E será interessante ver como as comunidades latinas nos EUA votarão nas eleições presidenciais.'

Professor de história da América Latina pela Brown University (em Providence, Rhode Island) e discípulo do recentemente falecido brasilianista Thomas Skidmore, o norte-americano James Green compartilha de uma visão negativista para o caso de Trump ascender ao poder. Além de considerar que o magnata não possui políticas internacionais coerentes e compreensivas, o estudioso crê que, quaisquer que sejam as linhas condutoras de governo do republicano, elas serão ruins para a América Latina.

“Trump não tem pistas em relação ao Brasil. Se eleito, ele gastará tanto tempo corrigindo todos os erros que cometerá, que a América Latina e o Brasil (à exceção do México) ficarão de fora da sua tela de radar”, prevê.

No entanto, Green sinaliza que Trump estaria mais alinhado ao governo de Michel Temer e com quaisquer presidentes adeptos de políticas neoliberais. “Embora diga ser contrário o livre mercado e o comércio global, o próprio Trump confessou que comercializa produtos produzidos na China”, ironizou.

De acordo com Green, não há dúvidas de que Trump terá de fazer algo para cumprir com as promessas de construir um muro na fronteira americana-mexicana. “Isso imediatamente causaria grave crise diplomática com o México e atrairia a solidariedade tremenda de todos os países da América Latina e do Caribe. Para não dizer da oposição da vasta maioria de latinos nos EUA. Isso também vai alienar o resto da América Latina. Trump se tornará odiado pelo povo da região.”

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