O empreendedor por trás da moda das barbearias
Pessoas

O empreendedor por trás da moda das barbearias

Conhecido como ‘Ostra’, o ex-mecânico e atual restaurador de cadeiras se esconde na região de Campinas, mas já vendeu para famosos como Zidane e Jô Soares e cobra R$ 18 mil por produto

em 21/10/2016 • 11h33
compartilhe:  

– Quem quebrou as barbearias foram os Beatles!

Frase ribombante que traduz a razão e circunstância pela qual Ostra passou a restaurar cadeiras de barbearias antigas e a ser um dos protagonistas desse novo cenário que está… na moda. Ele acredita que os Beatles, com aquela cabeleira toda, foram falindo as barbearias desde então.

Baby, se você não o conhece, tem a certeza absoluta que o cara é um astro do rock. Um verdadeiro Rock Star. YEAH! Se tiver tocando Elvis Presley então e ele pegar o microfone como gosta de fazer em festas e churrascos de amigos, vai insinuar passinhos e dancinhas totalmente old school. Com um Marlboro amarelo na boca e um copo de cerveja na outra mão, vai te olhar fixamente, esticar o braço apontando firme, e dizer:

– Aí é vida!

Se tem uma frase que resume o Ostra, ei-la: aí é vida!

46 anos. Nasceu: Jundiaí. Mora desde um ano em Nova Odessa, interior de SP. Nome: Ricardo Hedlund. Origem da árvore genealógica: sueca. Na casa dele, o gato permanece imóvel e sonolento enrolado no tapete, entre pés de cadeiras prontas e semi-prontas. Mais conhecida como Tina Turner. O papagaio Tito cantarola música de igreja em casa de ateu. Além destes fanfarrões moram mais três cachorros na casa: Hebe Camargo, Lana Lang e o Boris Casoy. O curioso é que eles gostam de comer banana.

– Minha vó morava em Ubatuba. Eu ia para lá e trazia ostras, há muitos anos. Aí eu jogava bola e o apelido ficou até hoje, explica Ricardo.

Seu pai arrumou trabalho na empresa Goodyear, instalada na cidade de Americana, e ficou por lá 30 anos trabalhando como mecânico de manutenção. Tal pai, tal filho.

Ostra também é mecânico. Trabalhou em empresas como Goodyear, Polyenka e Nestlé.

– Em 1995 comecei a aventurar, a trabalhar com madeiramento, restauração e não deixava a mecânica de lado, era apenas um hobby ainda. Também costumava reciclar, catar treco. Fazia como bico, restaurava e vendia uma coisa e outra. Já fiz de tudo, até pintura. Nunca fiquei dependendo do meu trampo para passar fome. Sempre procurei alternativas para ganhar grana.

Se ganhava bem como mecânico? A afirmação vem rápido:

– Sempre ganhei bem como mecânico. Duro eram as crises porque eu era moleque e sempre queria ganhar mais. Às vezes você achava um patrão chato, ou era mandado embora ou pedia a conta. Eu não aguentava nego falando besteira na minha orelha. Nunca fiquei preso num lugar, eu era meio boca aberta. Até hoje sou, sou chato mesmo. Mas sou legal também.

Suas ideias se convertem em ideias e mais ideias, criação e criatividade, falas, pensamentos rápidos e uma falta de paciência de ficar quieto e parado. Acende um cigarro, fuma, mas não até o fim. Acende outro Marlboro amarelo, mas não traga todo ele.

– Não consigo fumar um cigarro até o final. Meu pai era igualzinho.

Dos três filhos de Ostra (19, 21 e 24 anos) apenas um deles trabalha como barbeiro. Todos filhos do primeiro casamento e os dois mais novos moram com ele e com sua amada Daniela, quem cuida dos seus negócios, mas não do dinheiro. “Do dinheiro quem cuida sou eu”, ri.

Na garagem de sua casa estão objetivos antigos decorativos, alguns originais, outros restaurados. Coisas ligadas na tomada que acendem e apagam. Entrevistas e reportagens de jornais para os quais cedeu entrevista. Prateleiras com parafusos e trecos que não se sabe o nome, mas existem aos montes, separados mais ou menos por tamanho. Uma bagunça aos olhos dos outros. Mas para ele, tudo está no lugar certo, da melhor maneira. Peças de cadeiras prontas, outras ainda quase podres sem reparos, na fila de espera da ajuda para serem ressuscitadas pelas mãos da incubadora de Ostra.

Sua oficina também se confunde com um hospital. Ou com um museu. As peças que chegam em sua casa precisam de reparos grandes, limpeza, trato, carinho, atenção e em especial: muita calma para ouvir suas silenciosas histórias de vida. A impressão que dá é a de que Ostra conversa com cada cadeira que vai preparar e vai falando aos pouquinhos e ouvindo o que elas precisam para reviver. Vai dando vida, cor, e as deixa novas em folha! Uma palavra que ficaria de cenário, pendurada no portão da sua casa, seria RESPEITO. Por todo o passado que cada cadeira tem a contar.

São histórias vivas. Revivendo. Pulsando novamente.

Nos fundos da casa está o que ele chama de cemitério. Lá e em outra salinha estão partes soltas e algumas cadeiras encostadas que ele deixa com um sabor de quero mais para talvez oferecer para um cliente especial.

A paixão com a qual cuida dessas peças traz a história, às vezes, de anos luz atrás como por exemplo, de uma cadeira de 1823, que caiu em suas santas mãos e é avaliada em torno de R$ 12 mil. No ano de 2015 Ostra calcula seu lucro e sucesso em cima do restauro de 200 cadeiras no total. Porém, em compensação, diz que atualmente está bem parado e as vendas já chegaram a cair 80% em relação ao ano passado.

Muitos famosos e pessoas comuns já encomendaram seu trabalho. Alguns chegam e batem no seu portão que só fica encostado e está sempre destrancado. Na sua lista estão vendas de brilhar os olhos para Jô Soares, cujo pai era barbeiro, Lima Duarte, Dinho, João Gordo entre tantos outros que nem ele liga o tamanho do nome e sobrenome à dimensão de sua arte.

Em 2014 a VISA lançou uma campanha oficial na TV para a Copa do Mundo. No comercial, o jogador Paolo Rossi aparece fazendo a barba em uma barbearia fictícia, nada mais nada mesmo em cima de uma das obras primas do Ostra. Ao final da propaganda, entra Zidani, para quem ele vendeu 4 cadeiras.

Quanto custa uma?

– R$ 18 mil minha melhor cadeira. E uns R$15 mil uma cadeira boa.

Com essa mesma tranquilidade afirma que foi sim um dos responsáveis pelo ponta pé dessa moda da volta das barbearias com este conceito.

O tipo de negócio curioso começa quando, a seu pedido, quatro pessoas garimpam cadeiras antigas principalmente nas cidades de Maringá, Gaspar e Barretos. Depois que chegam em sua casa, começam os processos: fundição, acabamento, madeiramento, restauração, cromo e jateamento.

É possível que ele mesmo seja seu próprio concorrente, afirma. Já garimpou muito e hoje em dia as cadeiras estão ficando escassas. Por isso a nova saída é começar a fabricar e é isto que vem fazendo.

Dica importante do mestre: na finalização antes da entrega, para tirar as marcas dos dedos, dá-lhe limão galego com sal.

– Cliente pede, mas eu não mando foto antes!

A primeira barbearia para qual vendeu cadeiras foi a “9 de Julho”, em São Paulo. Hoje com 8 filiais na capital cobra o corte de cabelo masculino R$ 45, barba R$ 35 e máquina R$ 30.

O maior contrato de exclusividade que tem até 2020 é com a Barbearia Cavalera, que tem três lojas na capital no bairro do Bexiga, Oscar Freire e Vila Madalena. Um combo (cabelo e barba) sai por R$ 130 e leva até 75 minutos. Outras como a Cartola, Corleone e tantas espalhadas também pelo interior. Barba, cabelo e bigode. Action! Trabajo. Tudo em cima das cadeiras dele que pesam, em média, 100kg.

Concorrência? A única que julga no mesmo patamar de seu trabalho é a Ferrante, tradicional fabricante cuja existência carrega mais de 80 anos.

Desde 2002/2003, quando decidiu trabalhar com isso, já comprou e vendeu em torno de 600 cadeiras.

Aí é vida!

‍FOTOS: Márcio Salata

Comentários

Comentário